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27/10/2016 07h30 - Atualizado em 27/10/2016 07h30
Agricultor dono de ilha diz que ficou sem renda após morte de animais
Francisco Leite vendia porcos, manga e ovos antes da lama no Rio Doce.
Um ano após acidente, ele já cogita deixar ilha que chamava de 'paraíso'.
Cida AlvesDo G1, em Baixo Guandu
A Ilha das Orquídeas, cercada pelo Rio Doce em Baixo Guandu, já foi chamada de "pedaço de paraíso" pelo agricultor Francisco Leite, o Maninho. Ele diz que vivia ali com a mulher e os filhos, cuidava de porcos e galinhas e plantava mangas. A venda dos animais, dos ovos e das frutas garantia a renda familiar, e a própria natureza cuidava do sucesso do negócio: os bichos eram criados soltos, se alimentavam do que tinha na ilha, bebiam água do rio e se reproduziam à vontade.
Porém, a chegada da lama do rompimento da barragem da Samarco em Mariana, quase um ano atrás, mudou totalmente a Ilha das Orquídeas e a vida de Maninho. Ele afirma que perdeu boa parte dos bichos, que morreram após tomarem a água do Rio Doce manchado pelo rejeito de minério, e a empresa de sucos para a qual vendia suspendeu a compra das mangas, alegando medo de haver contaminação. Segundo Maninho, eles querem um laudo que comprove que a água está limpa.
Os animais que sobraram hoje ficam presos e precisam ser alimentados com ração - que Maninho compra com o cartão-auxílio que recebe da Samarco. “Na ilha e no rio eu só tinha lucro. E hoje eu só tô tendo despesa. Principalmente com alimentação dos meus animais.”
Agora, tudo que ele produz ali é para consumo próprio porque, além da produção ter caído drasticamente, o que ele ainda consegue levar para a rua ninguém que mais comprar.
“Hoje eu estou me mantendo da ajuda da minha mãe, o que eu podia vendar eu já vendi, para poder sustentar o que está aqui e não ver os bichos morrerem de fome”, diz.
“Eu tenho medo também, mas sou obrigado a consumir porque eu não tenho de onde tirar outra coisa. Eu tinha renda, hoje eu não tenho renda mais. Se eu não consumir o que está aqui, vou ter que comprar, e com que dinheiro eu vou comprar?”, acrescenta.
Produção
Nos oito hectares da ilha - o equivalente a 80 mil metros quadrados – Maninho diz que tinha quase 600 galinhas, que produziam até 40 dúzias de ovos por dia. “Hoje eu não tenho ovo para eu comer, porque minhas galinhas não estão colocando dois ovos por dia. Você põe elas para chocar, e não nasce nada”, afirma.
Nos oito hectares da ilha - o equivalente a 80 mil metros quadrados – Maninho diz que tinha quase 600 galinhas, que produziam até 40 dúzias de ovos por dia. “Hoje eu não tenho ovo para eu comer, porque minhas galinhas não estão colocando dois ovos por dia. Você põe elas para chocar, e não nasce nada”, afirma.
De aves, só sobraram cinco fêmeas e três machos. Muitos animais morreram logo que chegou a lama. Amigos de Maninho dizem que o agricultor chorava ao encontrar os bichos mortos espalhados pela ilha.
A criação de leitões, que era o forte da Ilha das Orquídeas, também minguou. “Eu tinha mais de 30 porcas de cria aqui, que davam até 15 leitões cada uma. De um ano para cá, os leitões que sobreviveram foram esses seis só, desde a chegada da lama”, diz.
Durante um tempo, Maninho trouxe água da cidade para dar aos animais. “Foi quando diminuiu a mortalidade, mas meu poder financeiro acabou e tive que voltar a dar água do rio para eles. Eu não tenho outra fonte de água”, afirma.
Maninho, mostra área onde acampavam grupos que iam visitar a Ilha das Orquídeas (Foto: Wagner Santos)
Maninho também não consegue mais receber pessoas na ilha. Ele tinha uma área que funcionava como um camping, com gramado para as barracas. Antes da lama, já tinha agendado para o ano novo um retiro de um grupo religioso, mas que teve de ser cancelado. Sem nenhum visitante para remar, nadar ou acampar na ilha, a área foi coberta pelo mato.
Com a chegada da lama, a família de Maninho deixou a ilha, e ele, após mais de 30 anos vivendo lá, hoje também cogita sair do local. “Eu não pensava em deixar a ilha, eu queria morrer aqui e ainda tenho fé em Deus de conseguir sobreviver, mas pelas notícias, eu já comecei a acreditar que vou ter que sair. Mas, se Deus ajudar, eu vou permanecer o resto da minha vida aqui”, diz.
Água
A Fundação Renova, criada pela Samarco para coordenar os programas de recuperação das áreas afetadas pela lama, disse que vem intensificando as ações de levantamento de dados e monitoramento hídrico na região do Rio Doce.
A Fundação Renova, criada pela Samarco para coordenar os programas de recuperação das áreas afetadas pela lama, disse que vem intensificando as ações de levantamento de dados e monitoramento hídrico na região do Rio Doce.
“Para facilitar o acesso às informações coletadas e intensificar o diálogo com as comunidades, a Fundação terá centros de informação ao longo do rio [...], onde os impactados poderão acompanhar, permanentemente, a situação da água em sua localidade e contribuir com sugestões de melhorias”, afirma em nota.
Disse ainda que “os resultados das análises na bacia do rio Doce demonstram atendimento aos padrões da qualidade da água”, exceto no índice de turbidez e sólidos suspensos totais no trecho entre a barragem da Samarco e Belo Oriente, em Minas Gerais.
“Mesmo assim, a Fundação reconhece que se trata de um programa continuado de médio/longo prazo, e se compromete a dar celeridade às iniciativas para trazer, de modo definitivo, uma situação de normalidade às regiões e comunidades impactadas.”
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